23.4.07

Dois espartanos em Fortaleza.

- Tô saindo de casa.
- E eu já tô chegando. Compro o seu ingresso e o meu e te espero na frente do cinema.
- Não dá. Você não tá com a minha carteira de estudante.
- Verdade. Droga! Deixei a minha em casa, vou voltar lá correndo.
- Certo. Te encontro lá na frente. Tá bom?
- Tá. Beijo.
Ele chegou lá aperreado, fez tudo correndo. Foi levantar a fitinha pra não ter que andar o caracol quilométrico e vazio que é a fila do cinema do Iguatemi dia de sábado dez da noite e uma mulher o encarou com um ar de reprovação. Ele entrou pela entrada e deu a volta completa: direita, anda, esquerda, anda, direita, anda, esquerda, anda, agora espera. Ficou sem acreditar no que fez, mas esqueceu rápido, lá vem ela, lá longe. Ela com aquele ar de quem procura, mas sabe pra onde está indo, só pra não parecer perdida. Ele levantou a mão e a menina veio correndo. Os dois em modo acelerado, pensando rápido, falando rápido, sem conseguir parar, era impossível conversar. A conversa era:
- Ainda tô em modo acelerado.
- É, eu também. Tô aqui suando. Andei o caracol todo.
- Não acredito. Sério?!?
E a fila demorava, demorava demais. Eles queriam sentar, parar um pouco. Finalmente, chegou a vez deles de comprar os ingressos.
- Boa noite.
- Boa. Dois pra Esparta, por favor.
- Esparta?!!!?
- Opa. Dois pra 300.
- O senhor tem um real?
- Tenho não.
- Tem sim, aquele que eu te dei hoje na delegacia.
- Tenho não, deixei no carro.
- Ah tá. Será que tenho aqui ainda?
- Moça, não precisa. Bom filme. Sala um.
- Obrigada.
Mais uma fila, dessa vez pra mostrar os ingressos. Já na fila, ele lembra: quero um chocolate. E aí depois de ponderar uns minutos se saíam ou não da fila, quase chegando a vez dos dois, saíram. E foram pra mais uma outra fila, a de comprar doce e pipoca. Ele ameaçou comprar pipoca pra menina, sabia que ela detestava. Ela disse que não queria nada. Ele comprou duas barras de chocolate crocante e um sprite. Finalmente entraram na sala de projeção. Estava passando um trailer de um filme com o Gael Garcia Bernal. A menina suspirou: adoro esse ator. E ele ainda inquieto: vamos sentar ali, não, melhor aqui. Sentaram, ele abriu um chocolate. Ainda tirando o sapato, a menina disse:
- Quero uma mordida.
- Esse é pra você.
- Pra mim?
- Porque você acha que eu comprei dois?
Ela encostou a cabeça no ombro dele, deu uma mordida no chocolate e o filme, que fala através das cores, começou. Os dois estavam em paz, encontraram a sintonia perfeita.

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