1.8.07

Eu devia ter gritado seu nome.

Agora, é uma daquelas coisas que eu tenho medo de me ouvir falando em voz alta, medo de me ouvir mentindo pro mundo, uma grande farsante. Pela primeira vez na minha vida, foi tudo verdade. E eu aqui fingindo todo dia que não foi nada, bancando a idiota, brincando de rotina normal. Foi tudo sangue, carne e alma. Sangue vermelho, daquele que escorre todo, mas não feito água que escorre rápido por entre os dedos, e sim feito óleo escuro e grosso, devagar, denso, capaz de poluir oceanos inteiros, acabar com ecossistemas. Capaz de matar e fazer sofrer, tudo isso bem devagar, tudo entranhado, tudo num emaranhado doido de texturas. E foi tudo verdade. Causou reações de espanto, derramou lágrimas, semeou angústia, preocupação, transformou rostos, foi uma verdadeira mutante de gente. E foi uma verdade que cresceu em pouco tempo, aumentou, esquentou, explodiu em novas cores, em novos traços, em incertezas e certezas. Enquanto a maioria do mundo seguiu inconsciente da mudança, ela duplicou, triplicou, quadruplicou de tamanho e rogou por atenção. Uma verdade inquieta, que nunca entendeu a sua incapacidade de ser feliz, de transformar seres comuns e sem propósito em pessoas mais bonitas, mais radiantes. Mas ela foi forte e persistente, se agarrou a mim, e eu fui ridícula, incapaz de dizer a ela que ficasse, que ela era linda demais, incandescente, ensurdecedora. Fechei os olhos e disse não, não estou te vendo, não estou te ouvindo, não estou te sentindo. E ela foi embora triste, despida, sozinha e com frio, muito frio. Morreu, virou mais uma mentira, mais uma brincadeira, mais uma coisa que não existe, e que nem nunca existiu. Morreu de verdade, virou ontem, virou semana passada, acabou. Levou junto um pedaço grande de mim.